Nelson Lage: "Chegou a hora de Portugal ser visto, não como o bom aluno, mas como o bom professor na energia"

7 out. 2025

Nelson Lage:

Portugal conseguiu o improvável: passar de 30% de renováveis para mais de 70%. O desafio agora é melhorar a rede elétrica, “o nosso calcanhar de Aquiles”, diz o presidente da ADENE, Nelson Lage.

“A ADENE teve um papel central na transição energética nacional”, um percurso que é visto lá fora como “notável” e “improvável”, desde que foi criada há 25 anos por António Guterres, diz o seu presidente em entrevista ao DN. Nelson Lage define-se como “inquieto”, movido por missões e com vontade de deixar marca na energia. Sempre com renovadas atribuições, a ADENE prepara-se agora para lançar o Observatório Ibérico de Energia, ao mesmo tempo que vai reforçar a cooperação internacional com os PALOP, anunciou o líder da Agência para a Energia. Porque “chegou a altura de deixar de ser o bom aluno e passar a ser o bom professor”. Afinal, temos “uma das maiores quotas de energia renovável a nível mundial”. Nelson Lage aponta, porém, desafios ao nível das redes e do armazenamento. “O nosso calcalcanhar de Aquiles é a rede elétrica”, admite. Mas confia nas 31 medidas recentemente apresentadas peloo Governo para aumentar a resiliência face a um apagão.

Nestes 25 anos da ADENE, que se celebraram esta semana, o setor passou por grandes transformações. Quais são as que destaca?

Destacaria três grandes mudanças ou transformações, quer pelo seu impacto prático, quer pelas implicações futuras. A primeira foi o reforço do compromisso político, com metas claras e ambiciosas inscritas na Lei de Bases do Clima e no PNEC 2030. Falamos de reduzir emissões em 55% até 2030 e em 90% até 2050. Aqui o maior desafio é que até 2030, mais de metade da energia que consumimos venha de fontes renováveis e que, no caso da eletricidade, essa proporção chegue a 93%.

A segunda grande transformação foi o crescimento das energias renováveis e da eficiência energética. Fechámos as centrais a carvão e substituímos esta produção por renováveis, tornando o nosso sistema elétrico um dos mais limpos e com uma das maiores quotas de renováveis a nível mundial.

A terceira mudança é mais recente, mas decisiva. Falo da modernização das redes através da digitalização e do desenvolvimento de smart grids que está a tornar o sistema mais fiável e preparado para integrar a produção renovável distribuída, ao mesmo tempo que permite uma participação mais ativa dos consumidores. É esta evolução que garante que a transição não é apenas produzir energia limpa, mas fazê-la chegar a todos com estabilidade e confiança.

De que forma estes novos processos estão e vão mudar o modo como vivemos, produzimos e trabalhamos?

A eficiência entrou em todo o lado, das casas aos carros elétricos, da indústria à forma como usamos a água. As transformações em curso estão já a mudar a forma como vivemos, produzimos e trabalhamos, e vão acelerar ainda mais nos próximos anos. Hoje, já não dependemos tanto do petróleo e do gás como antes. A energia está a tornar-se mais verde, mais local e mais inteligente. Um cidadão pode poupar centenas de euros por ano apenas por mudar de fornecedor ou por fazer pequenas melhorias em casa, como trocar janelas, instalar painéis solares ou ajustar hábitos de consumo. Isto é o poder nas mãos das pessoas. Na economia, há setores inteiros a reinventar-se. A indústria está a investir em eficiência para ser mais competitiva. Os edifícios estão a tornar-se mais inteligentes, mais eficientes e também mais confortáveis. E os serviços energéticos estão a digitalizar-se, criando os chamados empregos verdes e uma maior proximidade entre consumidores e produtores de energia.

O sucesso destas mudanças depende do Estado, a quem cabe acelerar a transição com políticas que não deixem ninguém para trás, mas também das empresas ao criarem modelos de negócio que apostem na inovação, eficiência e sustentabilidade, e dos cidadãos, que devem fazer escolhas mais informadas e assumir comportamentos mais conscientes.

Resumindo, política, formação, negócio e comportamento são pilares que se reforçam mutuamente, e quanto mais cedo os colocarmos em prática mais justa, rápida e eficaz será a transição.


 

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